domingo, 8 de outubro de 2006











um centímetro não mede
as angústias do papel
(não sabe
se dobra ou se bainha
o fim do corpo
que pretendem a ele)

domingo, 10 de setembro de 2006


perdida num canto
a poesia
e a moça noutro




sentados, amortecidos
abraça

(tenho pensado em moças
quando penso)

mas
meia colher de sangue só

foi tudo
o que disse
é o que chamam de hemorragia interna
já li.
vira pro lado
como é linda dormindo
como é linda

o som que sai não é da boca
tampouco do canto
onde ela está

- a mosca pousa
a janela clara -
os dois se olham como
se nunca antes

quando a moça jaz

com quase duas

colherinhas menos

quinta-feira, 7 de setembro de 2006


banhistas as moças
não coisas

--- (se coisas simplesmente não)



de pé sobre pés longos pescoços
longos
tecidos não

se algo
se verão
se tudo que já
mais terei de meu
não é

repouso a ver
se me há de convir

que as coisas
tantamente sim

terça-feira, 15 de agosto de 2006







escorrer
nalguma pia
- a dor -

funda
do prédio de engenharia

domingo, 16 de julho de 2006


primeiro percebeu
o peso das palavras e

para todos os efeitos
colou-as sobre si

quem passou viu

as palavras foram
ficando leves
como seda

e nada sendo
voaram
para onde

não sabe dizer.

sábado, 8 de julho de 2006


dois anos se foram
tirando fotos de
passantes de metrô

* *




(já não havia
ontem
mais pernas
para tantos cortes)

terça-feira, 16 de maio de 2006



cosideiras pensam na fabricação do rei.
conquanto eu
aqui sentada entre papéis -- de carta
pincéis, canetas de dizer nada e pontos para
frases de palavra --
penso

na fabricação do rei

sábado, 4 de março de 2006


sim, sinto agora. talvez seja algo dela ressurgindo, vindo a mim de pouco em pouco, um tanto recuante, temerosa. medo da interferência externa, da dissonância das coisas de fora, dos olhares opressores, do meu próprio julgamento. ela pede que eu fique assim, que fique em mim, assim. me despolua dos sentidos daqueles, do toque, do que não entendo e finjo.

sou tão idiota, cretina, que faço rir. inexprimível desse modo, pois assim me querem. assim se satisfazem de mim, de tudo que sou e não precisam entrar mais a fundo do que entrego. escondo meu cerne na superficie macia e desarticulada que me faço ser.

se a matei?

outro dia me procurei, não me vi.. estou tão enterrada em mim que pouco me acho. sinto que me perdi em algum canto do corpo. de alguma forma a troca, a expectativa, os temores de ser tão mínima me forçavam a esconder. a mostrar esta. empurrei-me tão pro fundo, para tão dentro das vísceras que tudo se sufocou e aquela não mais me grita. se ouço os girtos, já não sei se são dela. talvez tenha se dissolvido, multivariado, saindo de mim, deixando-me os retalhos e as memórias, como todo abandono implica.

[pausa para o gole de chá]

é tão meu, entende? é tão eu, meu, íntimo, tão pra dentro que dói. expor tudo para a indelicadeza e indiferença dos outros.. por que haveria? pôr-me ao avesso, ferir a mim em tudo que sou? não, não. melhor ficar aqui, ninguém entenderia. sou indiferente à minha própria interpretação. é como querer algo da linguagem.. sendo tão desprovida de entendimento. há coisas maiores que não admitem ficar subjugadas, então melhor calar. então me calo e aqui fico. se tudo fosse entendido não precisaríamos saber dizer. me calo agora, finjo que nos entendemos. faço-te mostrar esta que é macia e desconjuntada. enquanto fico no fundo quente, coberto por camadas intermináveis de cetim rosé, onde o que me contorna é suave, onde nem mesmo consigo saber onde. apenas sei o que é daqui de dentro, do que nem tu sabes. e é o que me interessa agora. vous comprenez?