sábado, 4 de março de 2006


sim, sinto agora. talvez seja algo dela ressurgindo, vindo a mim de pouco em pouco, um tanto recuante, temerosa. medo da interferência externa, da dissonância das coisas de fora, dos olhares opressores, do meu próprio julgamento. ela pede que eu fique assim, que fique em mim, assim. me despolua dos sentidos daqueles, do toque, do que não entendo e finjo.

sou tão idiota, cretina, que faço rir. inexprimível desse modo, pois assim me querem. assim se satisfazem de mim, de tudo que sou e não precisam entrar mais a fundo do que entrego. escondo meu cerne na superficie macia e desarticulada que me faço ser.

se a matei?

outro dia me procurei, não me vi.. estou tão enterrada em mim que pouco me acho. sinto que me perdi em algum canto do corpo. de alguma forma a troca, a expectativa, os temores de ser tão mínima me forçavam a esconder. a mostrar esta. empurrei-me tão pro fundo, para tão dentro das vísceras que tudo se sufocou e aquela não mais me grita. se ouço os girtos, já não sei se são dela. talvez tenha se dissolvido, multivariado, saindo de mim, deixando-me os retalhos e as memórias, como todo abandono implica.

[pausa para o gole de chá]

é tão meu, entende? é tão eu, meu, íntimo, tão pra dentro que dói. expor tudo para a indelicadeza e indiferença dos outros.. por que haveria? pôr-me ao avesso, ferir a mim em tudo que sou? não, não. melhor ficar aqui, ninguém entenderia. sou indiferente à minha própria interpretação. é como querer algo da linguagem.. sendo tão desprovida de entendimento. há coisas maiores que não admitem ficar subjugadas, então melhor calar. então me calo e aqui fico. se tudo fosse entendido não precisaríamos saber dizer. me calo agora, finjo que nos entendemos. faço-te mostrar esta que é macia e desconjuntada. enquanto fico no fundo quente, coberto por camadas intermináveis de cetim rosé, onde o que me contorna é suave, onde nem mesmo consigo saber onde. apenas sei o que é daqui de dentro, do que nem tu sabes. e é o que me interessa agora. vous comprenez?